O tempo
“Amor sem sexo ou sexo sem amor?”
“Fazer amor não é sexo?”
“Responde, vai.”
O que responder quando a pessoa que amas pergunta isso? Será que a resposta de uma pergunta tão vaga definirá o futuro do relacionamento?
“Amor.”
“Sem sexo?”
“Amor. Escolho amor. Que seja sem sexo!” — responde a verdade. Assim espera.
“Sem sexo?”
Não existe voltar atrás. Nem quer.
“Prefiro o amor. Prefiro amor e videogame do que sexo e videogame. Melhor duas coisas diferentes do que mais do mesmo, certo? E você? O que responde?”
Agora está em situação difícil. Não sabe o que responder também. Responder igual? Diferente? O que responder para uma pergunta tão sem pé nem cabeça?
“Eu não sei responder.” — disse a verdade.
“Eu também não sabia, mas agora eu sei. Eu respondi exatamente o que eu penso.”
“Eu ainda te quero, então devo escolher igual. Porque se você não quiser sexo, nem eu. Amor sem sexo.”
“Assim não vale.”
“O que não vale?”
“Copiar assim. Não vale.”
“Então devo responder diferente?”
“Deve responder a verdade.”
“Eu escolheria sexo apenas se meu amor por ele fosse maior que o meu amor pelas pessoas. Escolho amor. Não há outra escolha. Nem que fosse o amor pelo sexo, eu escolheria amor.”
“Que forma mais lógica de pensar! Só você mesmo… Porém, ainda não respondeste: amor pelo sexo ou pelas pessoas?”
“Amor por você. Pelas pessoas, mas principalmente por você. Te amo mais que todo sexo no mundo.”
Os dois não disseram mais nada nos cinco minutos seguintes. Apenas sentiram a calma brisa do amor. Tranquila sensação de que nada mais precisa ser feito. Não há urgências. Não há mais necessidades. O amor basta.
Um olha a perna do outro. Um olha o rosto do outro. Olha o corpo. Olha o quadril. Com as mãos, cada um sente para acreditar no que vê. Os pelos da nuca se levantam. Um gostoso calafrio passa pela espinha. Abraçam-se — melhor, enroscam-se. Não há onde começa um ou termina o outro.
Os dois se perdem, um na alma do outro. O tempo, guardião dos minutos, sai do quarto. Ele está triste por não haver ninguém para acompanhá-lo na solidão do espaço. Espera do lado de fora com a triste ilusão de que, no final, ele irá ganhar.
Dentro do quarto, não há espaço para o tempo. Os dois corpos se entrelaçam. A mão alisa a pele. Leva consigo um pedacinho do outro — que retribui numa gentil mordiscada. Trocam cheiros. Trocam gostos. Atracam-se.
Toca-se. Beija-se. Espreme-se. Belisca-se. Puxa-se. Empurra-se. Joga-se. Levanta-se. Morde-se. Vai. Mais. Cada vez mais. De novo. Outra vez. Continua-se. Mais forte. Cada vez mais.
A mão que alisa, agora segura forte. A mordiscada lambe e geme. No ar, uma onda começa a ganhar volume. Mexe. Roça. Enrosca! Mais! Até o fim. Forte. Devagar. Rápido. Vai. Sem parar. Não respira. Fecha o olho. A onda sustenta-se em pé, a um fio de quebrar. Puxa o ar. A onda quebra. Desmorona. Explode. Jorra. Vai. Para!
Chega um momento que o mundo para. O tempo desmaia do lado de fora. Não há quarto, cama, sofá, janela, nada. Não há tempo, nem espaço. O mundo acaba.
Uma mão carinhosa tira o cabelo da frente do rosto suado. O rosto sorri. O mundo vai se recompondo aos poucos. A mão beija o rosto com carinho. Em câmera lenta, um abraça ao outro. Aos pouquinhos, fecham-se os olhos. O amor dorme sossegado.
Algumas horas mais tarde, o guardião acorda assustado: dez para as sete! Abre a porta bruscamente. Coitado, perdeu toda a ação. Tempo, onde estavas? Só aparece na hora de acordar, na hora da cerimônia, no trânsito… Pobrezinho, não sabe aproveitar a vida.
Os dois acordam e olham o relógio: cinco para as sete! Exclamam em uníssono. Temos que tomar banho! — e escovar os dentes! O tempo sorri. É a hora dele. Curta o seu momento, tempo querido. Viveste tanto para não aprender nada assim? Que pena de ti! Curta seu momento agora. É tudo que tens, eu sei.
Leve para si a energia. Tome a juventude dos amantes. Roube tudo que há de especial no mundo. Pegue tudo que conseguir. Porém, metódico velhinho, jamais saberá o que é amar. Apesar de toda juventude que roubaste, jamais o encontrará. Afinal, velho companheiro, não há tempo no amor.
Comentários
Adicione seu comentáriojosiane
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intenso,confuso,explicativo,diz tudo que precisa ser dito na hora que se precisa dizer!